sábado, 1 de junho de 2013

Parabéns pra você!!


Esse texto foi o resultado de minha modesta participação da página de um amigo no facebook, que começou com seu « Bolo da sexta ». Ele fazia bolos toda sexta-feira, sempre acompanhados dos deliciosos textos que escreve. Para o aniversário de dois anos de sua empreitada, resolveu convidar amigos para se prestarem ao mesmo exercício que ele. Tive a honra de ser a primeira convidada, e de fazer o bolo de aniversário de dois anos do « Bolo da sexta ». Aqui está ele:

Parabéns pra você, nessa data querida !

Foi assim que começou a minha história com bolos…

Eu nunca fui muito ligada às artes culinárias. Muito pelo contrário, a cozinha sempre foi, para mim, a representação por excelência da submissão feminina. Um « piloto de fogão » era tudo o que eu não poderia ser. Certa ou errada, ainda não sei, queria outra coisa, já que o tal piloto representava, no meu imagnário, alguém que renuncia à sua própria vida para alimentar a vida de outros. Em vários sentidos. Então dei as costas para o mundo encantado da cozinha… Nunca aprendi a cozinhar, nunca fiz bolos, nunca me interessei por cores e sabores vindos de lá.

Até que minha filha, Julia, veio mudar os meus hábitos endurecidos. Não que eu tivesse me tornado um gourmet, ainda menos um chef, mas comecei a ter um certo prazer em poder fazer pequenas coisas que lhe agradassem, coisas que vinham também da cozinha. Mas bolos ? Bolos não, isso nunca. Na verdade, nunca fui muito afeita ao gosto mesmo do bolo, à tradição de um bolo com café… Poderia até comer um pouco, mas fazer… Fazer era todo um passo ainda muito prematuro para mim.

Julia fez então um ano e questões relativas a uma festa logo se colocaram, e a questão central, logicamente, para nós, brasileiros, era justamente saber como seria o tal bolo de aniversário… Como fazer? Eu, em Paris, querendo festejar o aniversário de um ano de minha filha, tradição completamente estranha para franceses, e querendo um bolo, daqueles bem bonitos, bem no centro da mesa. Já imaginava as fotos, aquelas que guardaria por toda minha vida, de minha filha soprando as velinhas, as primeiras.

Não sabia fazer um bolo, muito menos decorar um, então encomendei algo que encontrei de mais parecido. Encomendei um «fraisier», espécie de torta francesa de mousse de baunilha com morangos frescos. Ele estava bom, mesmo delicioso, mas não era um bolo de aniversário, ainda menos de criança. Então ficou aquele gostinho de que ainda faria uma festinha para minha filha como se deve, como fazemos nós, brasileiros.

Quando vivemos num país estrangeiro temos tendência a nos apegar a certas imagens que temos do que seria uma certa situação para nós, se estivéssemos « em casa ». Idealizamos essa situação e nos apegamos a ela como questão de honra. É uma forma de não se esvair totalmente na nova cultura, de se guardar uma espécie de bastião último do que seríamos verdadeiramente no âmago mais profundo. No meu caso, isso apareceu, entre outras, na situação dos aniversários de Julia. Gosto de fazer com ela exatamente o que tinha e que, de certa forma, todos temos no Brasil. Pensar no aniversário é pensar na festa, no bolo, no tema, na decoração até a mínima forminha de brigadeiro, nas lembrancinhas… Nada disso existe na França, e lá não há a mínima cultura de festas infantis. Eu, ao contrário, vinha de uma família onde festinhas de aniversário, mesmo as mais simples, eram cuidadas com zelo, com detalhes, e com muito sabor. Minha mãe sempre fez, e ainda faz, bolos maravilhosos, e minha tia – minha segunda mãe – era uma doceira ímpar que decorava bolos maravilhosamente bem.

Minha identidade passava então pela festa de aniversário, e a festa de aniversário passava pelo bolo… Tinha decidido que não faria mais um aniversário brasileiro com tortas francesas, precisava de um bolo, um bolo nosso, grande e decorado. Procurei durante muito tempo uma boleira brasileira em Paris, até que encontrei e no segundo ano o bolo foi um bolo brasileiro, ao menos na aparência. Sim, porque ele não era bom… E então fui pensando, amadurecendo a idéia de enfrentar o mundo misterioso da cozinha fazendo um bolo para o aniversário seguinte. Eu queria um bolo bom e bonito, e tinha um ano para aprender…


Passando umas férias de verão no Brasil em agosto, tomei a decisão e pedi à minha mãe, que sabe fazer bolos como ninguém, que me ensinasse (para sua imensa surpresa, ficou mesmo boquiaberta !). Incluímos Sônia no projeto, a diarista que trabalha com minha mãe e que faz bolos decorados para completar o mês. Ela trouxe materiais, glacê real e uma folha de papel de arroz para decorar. Era uma decorção simples dirigida a uma iniciante. Chegando em Paris, tentei repetir os ensinamentos e tudo saiu perfeito (para minha imensa surpresa, fiquei mesmo boquiaberta !). Não somente o bolo estava ótimo, mas ele também estva lindo e deixou em mim o desejo de continuar aprendendo. Estava certo, a partir de então, que os bolos de aniversário seriam todos feitos por mim.

Ninguém acreditava ! Eu, justo eu, fazendo bolos tão bonitos, tendo tanta paciência para decorá-los ? Como assim ? Sim, eu, e tinha gostado…

A partir daí todos os bolos da casa, assim como todos os bolos das casas amigas foram feitos por mim, e os bolos viraram uma espécie de desafio. A cada aniversário, cada festa, uma nova técnica, uma nova receita. Mas sobretudo novas técnicas de decoração. Do glacê real, passei para a pasta americana, da pasta americana para o buttercream e o buttercream com merengue suísso. E mais as técnicas evoluíam, mais era necessário ter certos conhecimentos que, eu, tendo rejeitado tanto pilotar um fogão, não sabia. Fui pegando então o caminho da cozinha, voltando atrás, mas não exatamente, porque ela agora era um lugar de festa.

Hoje é o aniversário do Bolo da Sexta. Dois anos… Dedico então, daqui de Salvador com a ajuda preciosa de minha mãe e de Sônia, com todo carinho, um bolo de aniversário no estilo dos meus primeiros… Os bolos que me reconciliaram com uma parte de mim mesma… Sei que, de certa forma, a reconciliação é também o espírito das suas sextas perfumadas de bolo.


Parabéns pra você, nessa data querida ! <3
Tereza

Para quem quiser, a receita do bolo veio daqui:
http://www.nlrockrecipes.com/2012/06/ultimate-lemon-cake.html